segunda-feira, 6 de outubro de 2008

VESTUÁRIO

No dia-a-dia o vestuário ocidental é bastante usado, todavia os têxteis locais congregam um significado muito importante nos rituais que celebram as mudanças das várias fases da vida (apresentação de um recém-nascido; casamento) ou o status social, nos rituais anímicos (enterro), outros que se prendem com a agricultura (iniciação de um jovem guerreiro na caça) ou em certos rituais que se prendem com as tradições do grupo (inaugu¬ração de uma casa).
Nas cerimónias, os homens vestem panos rectangu¬lares, denominados tais mane, compostos por dois ou três painéis cosidos entre si, que envergam à volta da cintura, e as mulheres vestem tais feto (sabulu) semelhantes, mas cosidos numa forma tubular, para assentar justo ao corpo, usados à volta da cintura ou atravessados na zona do peito, apenas com uma prega em baixo para permitir o movimento.
A grande diversidade cultural e linguística é transposta para os têxteis e, ao serem criados por grupos de etnias diferentes distinguem-se uns dos outros em termos de cores, motivos, técnicas utilizadas na tece¬lagem e no seu significado cultural.
Quando saem dos teares, os têxteis não são destinados, prio¬ritariamente, ao vestuário, excepto quando já estão gastos, ou aquando das cerimónias acima referidas. Todas estas cerimónias implicam o indivíduo, a linhagem, a família e a etnia a que se pertence e é, aqui, que a importân¬cia dos têxteis se revela, enquanto produtos de troca nas relações sociais e eco¬nómicas, assegurando a sobrevivência da linhagem e do grupo. Também pequenas faixas, ou lenços, cintos, malas para shiri ou bétel (estimulantes vegetais mastigáveis) e peças para a cabeça são popu¬lares como elementos de troca ou presentes. Todos estes elementos, de um modo geral, são decorados com sotis ou buna em vez de ikat.
As mulheres, quando ricas ou de determinada categoria social, vestem o “sarong batikado” (saia em forma tubular que vai desde a cintura aos pés, com padrões vários) e a “cabaia” (camiseiro com um corte próprio de Java) branca ou estampada à moda javaneza.

FIBRAS E TINGIDURAS

Os vários processos de fiação e tecelagem ocorrem, essen¬cialmente, durante a estação seca, sendo actividades femininas, muito valorizadas pelos membros de cada grupo, inteiramente, conscientes da importância dos têxteis nas relações mencionadas, anteriormente.
A principal fibra utilizada é o algodão e, onde ele é culti¬vado, a fiação manual é ainda comum, especialmente para têxteis que possuam um carácter especial.
O tais mane é composto por algodão, previamente, fiado e tingido com colorantes químicos, cumprido em ikat em teia. Já o Tais feto , igualmente em algodão, é bastante elaborado, sendo executado em ikat em teia e buna, com motivos de pássaro (Timor-Leste).
Timor tornou-se conhecido pelas cores vivas dos seus têxteis, embora essa não seja uma característica comum em todo o território. O vermelho é a cor dominante, pois para muitas comunidades está, tradicionalmente, associada à vida, ao sangue e à coragem. A maior parte das cores oriundas de corantes naturais provém, essencialmente, de três fontes, todas elas fáceis de obter em qualquer região da ilha:
Taun – Arbusto de cujas folhas se extrai uma tinta, que vai do tom azul-escuro ou esverdeado-escuro até ao preto. Uma vez colhi¬das, as folhas são esmagadas com um pilão. Numa das receitas mais populares, a esta pasta é adicionada água e cal, que reage com as folhas tornando o tinto mais escuro e permanente. Esta mis¬tura pode repousar assim vários dias, com os fios imergidos na solução, consoante o tom mais claro ou mais escuro pretendido, dentro da gama dos azuis-escuros e verdes-escuros.
Kinur – Trata-se da planta bulbosa açafrão, cujos estigmas são empregues para tingir. Uma vez extraídos, os estigmas são reduzidos a pó e misturados com, mais ou menos, água consoante o tom mais claro ou mais forte que se pretende. Deixa-se a solução repousar com os fios dentro, pelo menos um dia, duração esta que se prende, igualmente, com a vivacidade do tom que se quer obter. Consoante as receitas seguidas, consegue-se todas as tonalidades, que vão dos amarelos mais pálidos até aos laranjas mais fortes.
Teka – Árvore da teca, cujas folhas tenras são retiradas e esmagadas com um pilão. À pasta adiciona-se mais ou menos água consoante o tom mais rosa ou avermelhado que se pretende. Dependendo da receita e da quantidade de dias que se deixam os fios imergidos nesta solução, é possível obter tons de rosa e verme¬lho, de uma maior ou menor luminosidade e vivacidade.
Algumas das soluções supracitadas ainda são cozidas em panelas de barro.

TÉCNICAS DE TECELAGEM

Timor é reconhecido não só pela qualidade dos seus têxteis, mas também pelas diferentes técnicas decorativas, sendo a técnica de ikat a principal.
A técnica do ikat (atar antes de tingir), que pode ser execu¬tada nos fios da teia ou de trama, em Timor-Leste, aparece, unica¬mente, nos fios da teia. Este processo decorativo usa-se para repro¬duzir desenhos, a partir de cartões com os motivos executados em cestaria ou, mais comum nos dias de hoje e por influência dos portu-gueses, a partir dos desenhos em papel destinados a serem repro¬duzidos em crochet.
Nesta arte, os fios de algodão, ainda na sua cor original, são estendidos na armação de ikat, tal como foi mencionado anteriormente. A tecedeira, seguindo o desenho, vai atando com tiras vegetais secas ou ráfia os vários fios, cobrindo áreas que cor¬respondem ao motivo. Terminada esta tarefa, as meadas são retiradas da armação e tingidas na cor pretendida, sendo que as secções que estão unidas resistem ao corante. Após o tingimento e antes da tecelagem, os fios são tratados com uma solução de tapioca e água para os endurecer, tornando, portanto, mais fácil a tecelagem do padrão, que se quer apertado e nítido. As secções atadas são, então, desfeitas e o desenho surge na cor original do fio, recortado pela nova cor tingida. Uma vez tecidos os fios da teia, com um único fio de trama de uma só cor, são lavados em água fria diversas vezes, para amaciar o pano, dissolvendo-se assim a solução que o endureceu. Os coran¬tes são preparados com tal cuidado e perícia que, neste processo, não se observa virtualmente nenhuma perda de cor. O aspecto final dos tons do pano é suave e subtil, quase esbatidos, com motivos em ikat que parecem um negativo da cor natural dos fios.
Como complementos, encontram-se outras técnicas decorativas singulares de Timor, designadamente os sotis – passagem suplementar na teia, tecida de forma a parecer reversível –, e buna – trama suplementar descontínua, que dá o aspecto de um bordado. Qualquer destas técnicas, tal como foi mencionado ante¬riormente, varia muito de nome conforme a região da ilha, embora o processo de execução seja o mesmo.
A tecelagem é feita por tecedeiras que vivem nas comu¬nidades locais, sendo elas e as suas famílias responsáveis por todo o processo, desde a preparação dos fios à operação de atar as linhas para formar o desenho, seguindo-se o tingimento dos fios e culminando com a tecelagem dos panos. A produção inclui muitas vezes a combinação das técnicas de ikat e sotis (passagem suplementar na teia).

TEARES TRADICIONAIS

O fabrico das armações, onde é executada a técnica do ikat, e dos teares está, geralmente, a cargo dos homens. De funcionamento complexo, possuem, na esmaga¬dora maioria dos casos, um aspecto muito rudimentar.
A armação para a execução do ikat consiste numa estrutura de pouco mais de quatro paus de madeira, dispostos em forma de moldura, onde, com a ajuda de outros paus estreitos e amovíveis, as meadas são esticadas, escrupulosamente. Uma vez os fios paralelos uns aos outros a tecedeira inicia o seu minu¬cioso trabalho de atar, cobrindo pequenas porções de vários fios, de maneira a formar um desenho, só visível bastantes dias mais tarde, após o tingimento e novo esticamento das meadas na teia.
Os teares, bem mais complexos nos seus componentes, mas igualmente rudimentares, são teares de cintura (teares susten¬tados através de uma tira que passa atrás das costas da tecedeira). A tecedeira tem de trabalhar sentada no chão, de pernas estendidas, geralmente, em esteiras por elas elaboradas, esticando o próprio tear e a teia com a tensão exercida pelo seu corpo, atra¬vés de uma cinta que ela faz passar nas costas, na zona lombar. Este tipo de tear permite trabalhar com uma teia contínua que, com a técnica de tecelagem utilizada nesta região, produz tecidos com o mesmo aspecto e desenhos em ambos os lados, ou seja, não existindo direito e avesso.

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