segunda-feira, 21 de julho de 2008

HOMILIA DO PAPA NA MISSA DE ENCERRAMENTO DA JMJ

SYDNEY, domingo, 20 de julho de 2008 (ZENIT.org).- Publicamos a homilia de Bento XVI na missa de encerramento da Jornada Mundial da Juventude de Sydney, no hipódromo de Randwick, na manhã deste domingo.

CELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA PARA A XXIII JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE
HOMILIA DO SANTO PADRE BENTO XVI


Hipódromo de RandwickDomingo, 20 de Julho de 2008

Queridos amigos,
«Ides receber uma força, a do Espírito Santo, que descerá sobre vós» (Act 1, 8). Vimos hoje cumprida esta promessa. No dia de Pentecostes, como ouvimos na primeira leitura, o Senhor ressuscitado, sentado à direita do Pai, enviou o Espírito sobre os discípulos reunidos no Cenáculo. Com a força deste Espírito, Pedro e os Apóstolos foram pregar o Evangelho até aos confins da terra. Em cada idade e nas mais diversas línguas, a Igreja continua a proclamar pelo mundo inteiro as maravilhas de Deus, convidando todas as nações e povos a abraçar a fé, a esperança e a nova vida em Cristo.

Nestes dias, vim também eu como Sucessor de Pedro a esta maravilhosa terra da Austrália. Vim para confirmar-vos, meus jovens irmãos e irmãs, na vossa fé e abrir os vossos corações ao poder do Espírito de Cristo e à riqueza dos seus dons. Rezo para que esta grande assembleia, que congrega jovens «de todas as nações que há debaixo do céu» (Act 2, 5), se torne um novo Cenáculo. Que o fogo do amor de Deus desça sobre os vossos corações e os encha, a fim de vos unir cada vez mais ao Senhor e à sua Igreja e enviar-vos, como nova geração de apóstolos, para levar o mundo a Cristo.

«Ides receber uma força, a do Espírito Santo, que descerá sobre vós». Estas palavras do Senhor ressuscitado revestem-se de um significado particular para os jovens que vão ser confirmados, marcados com o dom do Espírito Santo, durante esta Santa Missa. Mas, tais palavras são dirigidas também a cada um de nós, isto é, a todos aqueles que receberam o dom do Espírito de reconciliação e da nova vida no Baptismo, que O acolheram nos seus corações como sua força e guia na Confirmação e que crescem diariamente nos seus dons de graça por meio da Sagrada Eucaristia. De facto, em cada Missa o Espírito Santo, invocado na oração solene da Igreja, desce novamente não só para transformar os nossos dons do pão e do vinho no Corpo e no Sangue do Senhor, mas também para transformar as nossas vidas fazendo de nós, com a sua força, «um só corpo e um só espírito em Cristo».

Mas, o que é este «poder» do Espírito Santo? É o poder da vida de Deus. É o poder do mesmo Espírito que pairou sobre as águas na alvorada da criação e que, na plenitude dos tempos, levantou Jesus da morte. É o poder que nos conduz, a nós e ao nosso mundo, para a vinda do Reino de Deus. No Evangelho de hoje, Jesus anuncia que começou uma nova era, na qual o Espírito Santo será derramado sobre a humanidade inteira (cf. Lc 4, 21). Ele próprio, concebido por obra do Espírito Santo e nascido da Virgem Maria, veio habitar entre nós para nos trazer este Espírito. Como fonte da nossa vida nova em Cristo, o Espírito Santo é também, de modo profundamente verdadeiro, a alma da Igreja, o amor que nos une ao Senhor e entre nós e a luz que abre os nossos olhos para verem as maravilhas da graça de Deus ao nosso redor.
Aqui na Austrália, nesta grande «Terra Austral do Espírito Santo», tivemos todos uma inesquecível experiência da presença e da força do Espírito na beleza da natureza. Os nossos olhos abriram-se para contemplar o mundo circundante tal como verdadeiramente é: «repleto – como disse o poeta – da grandeza de Deus», cheio da glória do seu amor criador. Também aqui, nesta grande assembleia de jovens cristãos vindos de todo o mundo, tivemos uma experiência concreta da presença e da força do Espírito na vida da Igreja. Vimos a Igreja na profunda verdade do seu ser: Corpo de Cristo, comunidade viva de amor, que engloba pessoas de toda a raça, nação e língua, de todos os tempos e lugares, na unidade que brota da nossa fé no Senhor ressuscitado.

A força do Espírito não cessa jamais de encher de vida a Igreja. Através da graça dos sacramentos dela, esta força flui também no nosso íntimo como um rio subterrâneo que alimenta o espírito e nos atrai e aproxima cada vez mais da fonte da nossa verdadeira vida, que é Cristo. Santo Inácio de Antioquia, que foi martirizado no início do século II, deixou-nos uma esplêndida descrição desta força do Espírito que habita dentro de nós. Falou do Espírito como de uma nascente de água viva que brotava no seu coração e lhe sussurrava: «Vem, vem para o Pai!» (cf. Aos Romanos 6, 1-9).

No entanto esta força, a graça do Espírito, não é algo que possamos merecer ou conquistar; podemos apenas recebê-la como puro dom. O amor de Deus pode propagar a sua força, somente quando lhe permitimos que nos mude a partir de dentro. Temos de O deixar penetrar na crosta dura da nossa indiferença, do nosso cansaço espiritual, do nosso cego conformismo com o espírito deste nosso tempo. Só então nos será possível consentir-Lhe que acenda a nossa imaginação e plasme os nossos desejos mais profundos. Eis o motivo por que é tão importante a oração: a oração diária, a oração privada no recolhimento dos nossos corações e diante do Santíssimo Sacramento e a oração litúrgica no coração da Igreja. A oração é pura receptividade à graça de Deus, amor em acto, comunhão com o Espírito que habita em nós e nos conduz através de Jesus, na Igreja, ao nosso Pai celeste. Na força do seu Espírito, Jesus está sempre presente nos nossos corações, esperando serenamente que nos acomodemos em silêncio junto d’Ele para ouvir a sua voz, permanecer no seu amor e receber a «força que vem do Alto», uma força que nos habilita a ser sal e luz para o nosso mundo.

Na sua Ascensão, o Senhor ressuscitado disse aos seus discípulos: «Sereis minhas testemunhas (…) até aos confins do mundo» (Act 1, 8). Aqui, na Austrália, damos graças ao Senhor pelo dom da fé que chegou até nós como um tesouro transmitido de geração em geração na comunhão da Igreja. Aqui, na Oceânia, damos graças de modo especial por todos os heróicos missionários, sacerdotes e religiosos diligentes, pais e avós cristãos, professores e catequistas que edificaram a Igreja nestas terras. Testemunhas como a Beata Mary MacKillop, São Peter Chanel, o Beato Peter To Rot e muitos outros. A força do Espírito, que se revelou nas suas vidas, está ainda em acção nas beneméritas iniciativas que deixaram, na sociedade que plasmaram e que agora é entregue a vós.

Amados jovens, permiti que vos ponha agora uma questão. E vós o que é que deixareis à próxima geração? Estais a construir as vossas vidas sobre alicerces firmes, estais a construir algo que há-de durar? Estais a viver a vossa existência de modo a dar espaço ao Espírito no meio dum mundo que quer esquecer Deus ou mesmo rejeitá-Lo em nome de uma falsa noção de liberdade? Como estais a usar os dons que vos foram dados, a «força» que o Espírito Santo está pronto, mesmo agora, a derramar sobre vós? Que herança deixareis aos jovens que virão? Qual será a diferença impressa por vós?

A força do Espírito Santo não se limita a iluminar-nos e a consolar-nos; orienta-nos também para o futuro, para a vinda do Reino de Deus. Que magnífica visão duma humanidade redimida e renovada entrevemos na nova era prometida pelo Evangelho de hoje! São Lucas diz-nos que Jesus Cristo é o cumprimento de todas as promessas de Deus, o Messias que possui em plenitude o Espírito Santo para comunicá-Lo à humanidade inteira. A efusão do Espírito de Cristo sobre a humanidade é um penhor de esperança e de libertação contra tudo aquilo que nos depaupera. Tal efusão dá nova vista ao cego, manda livres os oprimidos, e cria unidade na e com a diversidade (cf. Lc 4, 18-19; Is 61, 1-2). Esta força pode criar um mundo novo, pode «renovar a face da terra» (cf. Sal 104, 30).

Uma nova geração de cristãos, revigorada pelo Espírito e inspirando-se a uma rica visão de fé, é chamada a contribuir para a edificação dum mundo onde a vida seja acolhida, respeitada e cuidada amorosamente, e não rejeitada nem temida como uma ameaça e, consequentemente, destruída. Uma nova era em que o amor não seja ambicioso nem egoísta, mas puro, fiel e sinceramente livre, aberto aos outros, respeitador da sua dignidade, um amor que promova o bem de todos e irradie alegria e beleza. Uma nova era na qual a esperança nos liberte da superficialidade, apatia e egoísmo que mortificam as nossas almas e envenenam as relações humanas. Prezados jovens amigos, o Senhor está a pedir-vos que sejais profetas desta nova era, mensageiros do seu amor, capazes de atrair as pessoas para o Pai e construir um futuro de esperança para toda a humanidade.

O mundo tem necessidade desta renovação. Em muitas das nossas sociedades, ao lado da prosperidade material vai crescendo o deserto espiritual: um vazio interior, um medo indefinível, uma oculta sensação de desespero. Quantos dos nossos contemporâneos escavaram para si mesmos cisternas rotas e vazias (cf. Jer 2, 13) à procura desesperada de sentido, daquele sentido último que só o amor pode dar!? Este é o dom grande e libertador que o Evangelho traz consigo: revela a nossa dignidade de mulheres e homens criados à imagem e semelhança de Deus; revela a sublime vocação da humanidade, que é a de encontrar a própria plenitude no amor; desvenda a verdade sobre o homem, a verdade sobre a vida.

Também a Igreja tem necessidade desta renovação. Precisa da vossa fé, do vosso idealismo e da vossa generosidade, para poder ser sempre jovem no Espírito (cf. Lumen gentium, 4). Na segunda leitura de hoje, o apóstolo Paulo recorda-nos que todo o indivíduo cristão recebeu um dom, que deve ser usado para edificar o Corpo de Cristo. A Igreja tem uma especial necessidade do dom dos jovens, de todos os jovens. Ela precisa de crescer na força do Espírito, que agora mesmo vos enche de alegria a vós, jovens, e vos inspira a servir o Senhor com entusiasmo. Abri o vosso coração a esta força. Dirijo este apelo de forma especial àqueles que o Senhor chama à vida sacerdotal e consagrada. Não tenhais medo de dizer o vosso «sim» a Jesus, de encontrar a vossa alegria na realização da sua vontade, entregando-vos completamente para chegardes à santidade e pondo os vossos talentos a render para o serviço dos outros.

Daqui a pouco celebraremos o sacramento da Confirmação. O Espírito Santo descerá sobre os candidatos; estes serão «marcados» com o dom do Espírito e enviados para ser testemunhas de Cristo. Que significa receber o «selo» do Espírito Santo? Significa ficar indelevelmente marcados, inalteravelmente mudados, significa ser novas criaturas. Para aqueles que receberam este dom, nada mais pode ser como antes. Ser «baptizados» no Espírito significa ser incendiados pelo amor de Deus. «Beber» do Espírito (cf. 1 Cor 12, 13) significa ser refrescado pela beleza do plano de Deus sobre nós e o mundo, e tornar-se por sua vez uma fonte de refrigério para os outros. Ser «selados com o Espírito» significa além disso não ter medo de defender Cristo, deixando que a verdade do Evangelho permeie a nossa maneira de ver, pensar e agir, enquanto trabalhamos para o triunfo da civilização do amor.

Ao elevar a nossa oração pelos confirmandos, pedimos também que a força do Espírito Santo reavive a graça da Confirmação em cada um de nós. Oxalá o Espírito derrame os seus dons em abundância sobre todos os presentes, sobre a cidade de Sidney, sobre esta terra da Austrália e sobre todo o seu povo. Que cada um de nós seja renovado no espírito de sabedoria e de entendimento, espírito de conselho e de fortaleza, espírito de ciência e de piedade, espírito de santo temor de Deus.
Pela amorosa intercessão de Maria, Mãe da Igreja, que esta 23.ª Jornada Mundial da Juventude seja vivida como um novo Cenáculo, para que todos nós, inflamados no fogo do amor do Espírito Santo, possamos continuar a proclamar o Senhor ressuscitado atraindo para Ele todos os corações. Amen.

Tradução ao português difundida pela Santa Sé
© Copyright 2008 - Libreria Editrice Vaticana
ZP08071911 - 19-07-2008Permalink: http://www.zenit.org/article-19092?l=portuguese

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