EVANGELHO – Jo
6,1-15
Jesus é o Deus que Se revestiu da nossa humanidade e veio ao
nosso encontro para nos revelar o seu amor. O seu projecto – projecto que Ele
concretizou em cada palavra e em cada gesto enquanto percorreu, com os seus
discípulos, as vilas e aldeias da Palestina – consiste em libertar os homens de
tudo aquilo que os oprime e lhes rouba a vida. O nosso texto mostra Jesus
atento às necessidades da multidão, empenhado em saciar a fome de vida dos
homens, preocupado em apontar-lhes o caminho que conduz da escravidão à
liberdade. A atitude de Jesus é, para nós, uma expressão clara do amor e da
bondade de um Deus sempre atento às necessidades do seu Povo. Garante-nos que,
ao longo do caminho da vida, Deus vai ao nosso lado, atento aos nossos dramas e
misérias, empenhado em satisfazer as nossas necessidades, preocupado em dar-nos
o “pão” que sacia a nossa fome de vida. A nós, compete-nos abrir o coração ao
seu amor e acolher as propostas libertadoras que Ele nos faz.
• A “fome” de pão que a multidão sente e que Jesus quer saciar é
um símbolo da fome de vida que faz sofrer tantos dos nossos irmãos… Os que têm
“fome” são aqueles que são explorados e injustiçados e que não conseguem
libertar-se; são os que vivem na solidão, sem família, sem amigos e sem amor;
são os que têm que deixar a sua terra e enfrentar uma cultura, uma língua, um
ambiente estranho para poderem oferecer condições de subsistência à sua
família; são os marginalizados, abandonados, segregados por causa da cor da sua
pele, por causa do seu estatuto social ou económico, ou por não terem acesso à
educação e aos bens culturais de que a maioria desfruta; são as crianças
vítimas da violência e da exploração; são as vítimas da economia global, cuja
vida dança ao sabor dos interesses das multinacionais; são as vítimas do
imperialismo e dos interesses dos grandes do mundo… É a esses e a todos os
outros que têm “fome” de vida e de felicidade, que a proposta de Jesus se
dirige.
• No nosso Evangelho, Jesus dirige-Se aos seus discípulos e
diz-lhes: “dai-lhes vós mesmos de comer”. Os discípulos de Jesus são convidados
a continuar a missão de Jesus e a distribuírem o “pão” que mata a fome de vida,
de justiça, de liberdade, de esperança, de felicidade de que os homens sofrem.
Depois disto, nenhum discípulo de Jesus pode olhar tranquilamente os seus
irmãos com “fome” e dizer que não tem nada com isso… Os discípulos de Jesus são
convidados a responsabilizarem-se pela “fome” dos homens e a fazerem tudo o que
está ao seu alcance para devolver a vida e a esperança a todos aqueles que
vivem na miséria, no sofrimento, no desespero.
• No nosso Evangelho, os discípulos constatam que, recorrendo ao
sistema económico vigente, é impossível responder à “fome” dos necessitados. O
sistema capitalista vigente – que, quando muito, distribui a conta gotas
migalhas da riqueza para adormecer a revolta dos explorados – será sempre um
sistema que se apoia na lógica egoísta do lucro e que só cria mais opressão,
mais dependência, mais necessidade. Não chega criar melhores programas de
assistência social ou programas de rendimento mínimo garantido, ou outros
sistemas que apenas perpetuam a injustiça… Os discípulos de Jesus têm de
encontrar outros caminhos e de propor ao mundo que adopte outros valores.
Quais?
• Jesus propõe algo de realmente novo: propõe uma lógica de
partilha. Os discípulos de Jesus são convidados a reconhecer que os bens são um
dom de Deus para todos os homens e que pertencem a todos; são convidados a
quebrar a lógica do açambarcamento egoísta dos bens e a pôr os dons de Deus ao
serviço de todos. Como resultado, não se obtém apenas a saciedade dos que têm
fome, mas um novo relacionamento fraterno entre quem dá e quem recebe, feito de
reconhecimento e harmonia que enriquece ambos e é o pressuposto de uma nova
ordem, de um novo relacionamento entre os homens. É esta a proposta de Deus; e
é disto que os discípulos são chamados a dar testemunho.
• Os discípulos de Jesus não podem, contudo, dirigir-se aos
irmãos necessitados olhando-os “do alto”, instalados nos seus esquemas de poder
e autoridade, usando a caridade como instrumento de apoio aos seus projectos
pessoais, ou exigindo algo em troca… Os discípulos de Jesus devem ser um grupo
humilde (a “criança” do Evangelho), sem pretensão alguma de poder e de domínio,
e que apenas está preocupado em servir os irmãos com “fome”.
• O que resulta da proposta de Jesus é uma humanidade totalmente
livre da escravidão dos bens. Os necessitados tornam-se livres porque têm o
necessário para viverem uma vida digna e humana; os que repartem os bens
libertam-se da lógica egoísta dos bens e da escravidão do dinheiro e descobrem
a liberdade do amor e do serviço.
• No final, os discípulos são convidados a recolher os restos,
que devem servir para outras “multiplicações”. A tarefa dos discípulos de Jesus
é uma tarefa nunca acabada, que deverá recomeçar em qualquer tempo e em
qualquer lugar onde haja um irmão “com fome”.